Demandas da Empresa e Expectativas de Carreira dos Profissionais: Diferenças de Comportamento da Empresa e dos Profissionais

Vanderlei Silva

Publicado em fevereiro de 2016


Nas últimas duas ou três décadas, com a crescente competição entre as empresas e o prolongado e relativamente baixo crescimento da economia brasileira, as empresas vêm se reestruturando e se adaptando para funcionar com menos pessoas.

Um departamento administrativo que há vinte anos atrás tivesse dez pessoas, hoje talvez tenha apenas dois ou três funcionários. A tecnologia teve o seu papel nessa redução do quadro de pessoal. Mas, os processos internos e a forma de gestão da empresa também foram adaptados para a necessidade de redução de custos de pessoal.

Apesar de que o nível de qualificação profissional de um modo geral talvez ter até diminuído ao longo do tempo, em função da baixa qualidade do ensino e falta de oportunidades de crescimento dentro das empresas, o comportamento dos profissionais apresentou uma mudança perceptível nos últimos anos.

Hoje em dia, tanto profissionais realmente capacitados, quanto aqueles com nível de competência abaixo do esperado pelas empresas, têm aspirações bem definidas e buscam oportunidades de crescer profissionalmente de forma mais rápida do que há vinte anos atrás.

Essa mudança no comportamento dos profissionais causou um descompasso entre os procedimentos das empresas para recrutar, selecionar, promover e treinar seus quadros de pessoal e as expectativas dos profissionais.

O recrutamento e seleção de um novo funcionário ou as análises para a promoção de um funcionário que já trabalha da empresa geralmente se concentram em dois pontos básicos:

1) a competência do candidato para as responsabilidades do cargo, tais como retratadas na descrição do cargo;

2) o perfil comportamental definido para o cargo.

A descrição das responsabilidades geralmente apresenta um razoável grau de precisão em relação ao que realmente é importante no cargo.

No entanto, no que diz respeito ao perfil do cargo, o contexto em que as responsabilidades do cargo serão desempenhadas varia muito de um cargo para outro e de uma empresa para outra. Esse fato afeta a análise do perfil da pessoa, já que as informações relacionadas com o contexto em que a pessoa vai atuar raramente são levadas em consideração ao se fazer a análise do perfil do candidato.

A situação real em que a pessoa vai executar suas funções pode ter uma influência decisiva no desempenho futuro dela no cargo.

Por exemplo, raramente é feita uma análise da compatibilidade do perfil do candidato com o perfil do superior imediato a quem a pessoa contratada ou o funcionário promovido irá responder. A pessoa sendo considerada para contratação ou para promoção é sabatinada em relação a seus conhecimentos e eventualmente submetida a testes psicológicos ou entrevista específica, às vezes até dinâmicas de grupo, para identificar seu perfil comportamental.

Ocorre que na vida real, o novo contratado ou funcionário promovido pode ter de responder a um líder que tem como traço marcante do seu perfil comportamental exigir que seus liderados aceitem seu modo pessoal de conduzir a equipe.

Não existe um líder perfeito ou “de livro”. Os líderes são pessoas humanas com seus defeitos ou esquisitices comportamentais ou de personalidade.

Por exemplo, um líder que não gosta muito de ser questionado pelos seus liderados em relação a suas decisões ou instruções sobre como fazer as coisas, pode desenvolver uma certa má vontade em relação a um profissional extremamente competente, mas que tem o hábito de falar o pensa sem se preocupar com o que os outros possam achar de seus pontos de vista.

“Como eu estou certo, o chefe vai reconhecer meu ponto de vista e talvez até me elogiar”. Errado. O chefe obviamente vai sempre agir de forma politicamente correta e talvez até publicamente reconhecer a boa ideia do funcionário. Mas, no fundo, ficará ressentido com o comportamento do funcionário e poderá boicotar o trabalho dele no futuro. Geralmente, os líderes são muito competentes em achar explicações convincentes para justificar suas ações e decisões.

Para aumentar o grau de acerto nas contratações e promoções internas, a empresa poderia incluir mais esse item na análise dos candidatos: a análise da compatibilidade do perfil do candidato com o perfil do seu futuro chefe imediato.

Essa análise poderia considerar também o perfil da equipe atual em que o novo funcionário irá atuar. Todos os potenciais “pontos de atrito” deveriam ser investigados e avaliados. Essa é uma tarefa que iria exigir inicialmente um pouco mais de tempo na análise, mas daria às pessoas encarregadas dessas avaliações um conhecimento e condições de tomar decisões mais acertadas nesse processo, evitando retrabalhos e gerando economia nos custos de pessoal.

Os procedimentos para essas análises devem ser bem definidos pela empresa, a fim de evitar o “corporativismo” interno, isto é, a escolha dos “apaniguados” para promoção, em detrimento das pessoas realmente melhor qualificadas nos aspectos técnicos e comportamentais.

“Empatia” entre o líder e cada um dos seus liderados é um requisito essencial para o sucesso da carreira, tanto de cada funcionário, como do líder e da equipe como um todo.

Um exemplo que talvez seja bem representativo dessa empatia entre o líder e cada membro de sua equipe é o caso das sucessões no topo de grandes empresas. O sucessor geralmente é alguém em quem o “sucedido” e outros membros da diretoria ou do conselho de administração tenham total confiança. Não precisa ser a pessoa tecnicamente mais preparada para o cargo. Mas, com certeza precisa ser alguém confiável do ponto de vista de quem irá tomar a decisão.

Numa reportagem há muitos anos atrás, um dos nossos mais notáveis executivos, o Henrique Meirelles, contou como foi sua nomeação para a presidência do banco estrangeiro em que trabalhava no Brasil. Um dos aspectos interessantes dessa narrativa, foi que o presidente do banco o chamou e atribuiu a ele determinada tarefa. Se ele “quebrasse esse galho” e cumprisse a tarefa solicitada, o presidente do banco o indicaria para sucede-lo no cargo. O Henrique Meirelles contou na entrevista que havia umas dez pessoas em condições de ocupar o cargo de presidente do banco. No entanto, os aspectos “confiança” e “empatia” provavelmente foram decisivos nesse passo importante para o subsequente enorme sucesso de sua carreira na referida instituição.

Vanderlei Silva é consultor, especializado em ajudar empresas a remunerar, incentivar e melhorar o desempenho de seus profissionais. Para contatá-lo, envie e-mail para vsilva@promerito.com.br ou ligue para 31-2516-8425, em Belo Horizonte, MG.


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